OSCAR WILDE – ficcionista

Shirley Carreira

O único romance de Oscar Wilde (Dublin, 16/10/1854 – Paris, 30/11/1900), O retrato de Dorian Gray, foi publicado em 1891. Acusado de escrever um livro imoral, voltado ao hedonismo e com tendências homoeróticas, Wilde achou necessário revisar a obra, acrescentando mais sete capítulos, nos quais criou novos personagens e modificou o enredo, além de um prefácio no qual defende os ideais Esteticistas da “arte pela arte”, indo contra os idealistas vitorianos, que pregavam que a arte deveria ter uma influência positiva e moralmente edificante. Embora centrado prioritariamente no Esteticismo, o romance apresenta elementos insólitos, que evocam a estética gótica, muito embora os elementos góticos presentes na obra estejam estreitamente ligados ao Decadentismo.

O romance narra a história de Dorian Gray, um jovem de beleza extraordinária, descrito como um “Adônis, feito, ao que parece, de marfim e pétalas de rosa” (WILDE, 2010, p. 8), que tem seu retrato pintado por Basil, um artista cuja vida muda depois de conhecer o jovem. Porém, é ao conhecer Lorde Henry, amigo de Basil, que a vida de Dorian se transforma. Afetado pela visão hedonista de Lorde Henry, o jovem passa a crer que a beleza é o único valor existente na vida. Diante da pintura que Basil fez dele, Dorian diz que daria sua alma para que o retrato envelhecesse em seu lugar, iniciando, assim, o desenvolvimento do enredo com a temática da corrupção da alma pelo desejo de juventude e beleza eterna. O retrato assume as características do duplo (doppelgänger), passando a envelhecer à medida que a natureza de Dorian se degenera.

Além da imagem do duplo, há alguns elementos da tradição gótica que estão presentes no romance de Wilde (SANTOS; CARREIRA, 2018), como, por exemplo, a cidade como locus horribilis (SVOBODOVÁ, 2016), os antros de ópio como espaço do horror finissecular (PUNTER & BYRON, 2004) e o sobrenatural tratado do ponto de vista da barganha faustiana. De acordo com Punter & Byron, “inúmeras ficções góticas da decadência focam em monstruosos corpos metamórficos” (PUNTER & BYRON, p. 23, tradução nossa) e, em O retrato de Dorian Gray, essa metamorfose ocorre ao final tanto no retrato quanto no corpo do protagonista.

Em 28 de fevereiro de 1895, o pai de Lord Alfred, o marquês de Queensberry, acusou publicamente Wilde de “sodomia”. Queensberry vinha a algum tempo incomodando Wilde com cartas, notas e confrontos insultuosos e esperava interromper a primeira apresentação da peça The Importance of Being Earnest com uma demonstração pública, que nunca aconteceu. Incitado por Lord Alfred Douglas, Wilde cometeu um erro estratégico, que foi fortemente desaconselhado por seus amigos: processou o marquês por difamação e perdeu. Como a Lei de Alteração da Lei Criminal de 1885 tornava os atos homossexuais puníveis com até dois anos de prisão, Wilde deveria ter saído do país, porém optou por ficar e foi preso. Apesar das informações sobre a vida privada de Wilde e as provas documentais apresentadas no julgamento, a acusação inicialmente não teve sucesso. No entanto, no dia 27 de maio de 1895, Wilde foi julgado uma segunda vez, condenado e sentenciado à prisão por dois anos de trabalhos forçados por atentado ao pudor, apesar das inúmeras petições de clemência encaminhadas pelos mais importantes círculos literários europeus.

As razões de Wilde ter permanecido na Inglaterra não são claras, no entanto, há indícios de que o julgamento foi uma resposta do governo ao Marquês de Queensberry, já que o seu filho mais velho também estava tendo um caso homossexual com Archibald Philip Primrose, Lord Rosebery, o homem que se tornaria primeiro-ministro. Ante a indignação do pai, que ameaçou revelar o relacionamento, a punição de Wilde foi um esforço do governo para apaziguá-lo.

Wilde cumpriu sua sentença em condições de extrema dificuldade e crueldade. Depois de ser libertado da prisão, com a saúde e o espírito abalados, ele procurou exílio na França, onde viveu os últimos dois anos de sua vida na pobreza e na obscuridade sob um nome falso, Sebastian Melmoth. Morreu de meningite em 30 de novembro de 1900.

REFERÊNCIAS

SANTOS, Laís M.; CARREIRA, Shirley S. G. Elementos da tradição gótica em O retrato de Dorian Gray. E-scrita. Nilópolis, v. 9, p. 166-178, 2018. Disponível em: https://revista.uniabeu.edu.br/index.php/RE/article/view/3460/pdf. Acesso em 15 nov. 2021.
PUNTER, David; BYRON, Glennis. The Gothic. Oxford: Blackwell Publishing Ltd, 2004.
SVOBODOVÁ, Iva. Gothic Presence in The Picture of Dorian Gray. 50f. Dissertation. Course of English Philology, Department of English and American Studies, Palacky Univerzity Olomouc, Olomouc, 2016.
WILDE, Oscar. The Picture of Dorian Gray. Victoria, Canada: University of Victoria, 2011.
WILDE, Oscar. O Retrato de Dorian Gray. Tradução de José Eduardo Ribeiro Moretzsohn. Porto Alegre: L & PM, 2010.

BIBLIOGRAFIA COMPLEMENTAR

BECKSON, Karl (Ed.). Oscar Wilde– the critical heritage. London, New York: Taylor & Francis e-Library, 2005.
FERNÁNDEZ, Tomás y Tamaro, Elena. Biografia de Oscar Wilde. En: Biografías y Vidas. La enciclopedia biográfica en línea [Internet]. Barcelona, España, 2004. Disponível em: https://www.biografiasyvidas.com/biografia/w/wilde.htm. Acesso em 25 nov. 2021.
GIFFORD, James. Introduction. In: WILDE, Oscar. The Picture of Dorian Gray. Victoria, Canada: University of Victoria, 2011.
HART-DAVIES, Rupert (Ed.) The Letters of Oscar Wilde. New York: Harcourt, Brace & World Inc., 1962.
WILDE, Oscar; MCKENNA, Neil. The secret life of Oscar Wilde: [an intimate biography]. New York: Basic books, 2012.