MONTEIRO LOBATO – ficcionista

Maurício Cesar Menon

José Renato Monteiro Lobato nasceu em 18 de abril de 1882, em Taubaté, filho de José Bento Marcondes Lobato e Olímpia Augusta Monteiro Lobato. Em 1888, já alfabetizado pela mãe, o menino tem aulas particulares com Joviano Barbosa, frequentando, nos anos seguintes, os Colégios Kenedy, Americano e Paulista; em 1893 altera seu nome para José Bento e muda-se para o Colégio São João Evangelista. Após ser reprovado, no início de 1896, nos exames para o curso preparatório, em São Paulo, retorna à cidade natal e ao Colégio Paulista, onde colaborará no jornalzinho da instituição; é nesta fase da vida que dedica muito tempo à leitura e, ao final desse mesmo ano, consegue aprovação nos exames que presta, transferindo-se como interno para o Instituto Ciências e Letras, em São Paulo. Em 1900, ingressa na Faculdade de Direito de São Paulo, formando-se em 1904.

Na Faculdade de Direito, a atividade literária de Lobato se intensifica, mas é apenas a partir da publicação de “Velha Praga”, em 12 de novembro de 1914 no Estado de São Paulo, que começa a ganhar maior visibilidade. A propensão do escritor a lidar com assuntos ligados à fantasia e ao insólito já é demonstrada a partir de uma pesquisa que faz para esse jornal a respeito do saci, em 1917, que veio a se transformar no livro O Saci-Pererê: resultado de um inquérito, em 1918. Em julho desse ano vem à tona o livro Urupês, no qual alguns dos contos são perpassados pela violência e pelo estranho, como é o caso de “Os Faroleiros” e “Bucólica”, outros ganham a coloração da lenda como em “A Vingança da Peroba” ou lidam diretamente com os aspectos ligados ao teratológico, caso do emblemático “Bocatorta”.

No livro Negrinha, de 1920, os temas ligados ao sobrenatural e ao monstruoso também se fazem presentes, valendo assinalar contos como “Os Negros” e “Bugio Moqueado”. No primeiro narra-se um caso de possessão por um espírito que revelará o caso macabro de crueldade e de emparedamento ocorrido, no passado, na antiga fazenda em que estão abrigados de forte tempestade dois viajantes; no segundo, aflora a monstruosidade do coronel Teotonio, ao obrigar a própria esposa praticar necrofagia. Lobato, dono de um estilo fluido e simples, não se furta aos temas que despertam o terror ou o horror, antes consegue ambientá-los no Brasil, amalgamando-os, muitas vezes, a lendas, histórias populares e ao grande repertório de leituras estrangeiras que tinha – no conto homônimo contido em Negrinha, tem-se uma leve fragrância, pela mistura da fantasia a um realismo dramático, de alguns dos contos de Hans Christian Andersen.

Em O Presidente Negro, único romance que escreve e publica em folhetim, em 1926, Monteiro Lobato dá asas a uma narrativa de caráter distópico, passada nos Estados Unidos, no ano de 2228, quando três candidatos – uma mulher, um branco e um negro – disputam a eleição para a Casa Branca.

Apesar de uma obra voltada a leitores adultos, bastante profícua, que inclui contos, romance, ensaios, cartas etc., é pela literatura direcionada às crianças que o autor se torna célebre, sendo considerado, de forma quase uníssona, como o pai da literatura infantil no Brasil. É nela, especialmente nos livros que compõem o Sítio do Picapau Amarelo, que a fantasia de Lobato não encontra limites. Da mixagem entre elementos nacionais do folclore, das lendas, dos contos populares e da literatura universal, do cinema, da mitologia entre outros, nasce um imenso caleidoscópio onde personagens de criação própria, como Emília, Narizinho, Pedrinho, Tia Nastácia, Dona Benta, O Visconde de Sabugosa e demais viverão as mais prodigiosas aventuras repletas de elementos ligados à fantasia, ao imaginário e à ciência. Sem dúvida alguma, este tem se constituído o filão lobatiano mais caro à pesquisa acadêmica desde sua publicação.

Monteiro Lobato foi um intelctual intensamente ligado aos problemas brasileiros, cercado por polêmicas, porém, acima de tudo, forjou-se como um homem das letras, seja como escritor, como tradutor ou como editor. Morreu em 4 de julho de 1948, deixando uma das heranças literárias mais ricas, sólidas e, muitas vezes, polêmicas, ligada à Literatura Brasileira.

BILBIOGRAFIA COMPLEMENTAR

CAUSO, Roberto de Sousa. Ficção Científica e Horror no Brasil 1875 a 1950. Belo Horizonte: Editora UFMG, 2003.
FERNANDES, Caroline Aparecida dos Santos. A Concepção do Monstro em Bocatorta de Monteiro Lobato. Anais do EVINCI UNIBRASIL, v. 1, n. 4, p. 1-12, 2015.
LAJOLO, Marisa. Monteiro Lobato um Brasileiro sob Medida. São Paulo: Moderna, 2000.
LAJOLO, Marisa; CECCANTINI, João Luís (Orgs). Monteiro Lobato, Livro a Livro – Obra Infantil. São Paulo: Editora UNESP; Imprensa Oficial do estado de São Paulo, 2009.
LOBATO, Monteiro (1950). Negrinha. São Paulo: Brasiliense, 1950.
LOBATO, Monteiro (1950). Urupês. São Paulo: Brasiliense, 1950
LOBATO, Monteiro (2008). O Presidente Negro. São Paulo: Globo, 2008.
LOBATO, Monteiro (2008). O Saci-Pererê: Resultado de um Inquérito. São Paulo: Globo, 2008.
LOBATO, Monteiro (2014). Reinações de Narizinho. São Paulo: Globo, 2014.
LOPES, Eliane Maria Teixeira, et. al. Lendo e Escrevendo Lobato. Belo Horizonte: Autêntica, 1999.
PASSIANI, Ênio. Na Trilha do Jeca: Monteiro Lobato e a Formação do Campo Literário no Brasil. Bauru SP: EDUSC, 2003.
MENON, Mauricio César. Figurações do Gótico e de seus Desmembramentos na Literatura Brasileira; de 1843 a 1932. Tese (Doutorado em Letras). Faculdade de Letras, Universidade Estadual de Londrina, Paraná, 2007.
MENON, Mauricio César. A Anatomia do Mal em um Conto de Monteiro Lobato. In: SANTOS, Josalba Fabiana dos; JEHA, Júlio. Sobre o Mal. Curitiba: Appris, 2015.
SANTOS, Fabiano Rodrigo da Silva (2016). A Face Disforme da Belle Époque. O Monstruoso e a Cosmovisão de Eu, de Augusto dos Anjos, e de Urupês, de Monteiro Lobato. Santa Catarina: Revista Outra Travessia, n. 22, p. 1-22, 2016.