JOSÉ J. VEIGA – ficcionista

João Olinto Trindade Junior

A prosa de José J(acinto) Veiga (Corumbá de Goiás, 1915 – Rio de Janeiro, 1999) alimenta-se de elementos do falar goiano (CAMPEDELLI, 1982, p. 96), tendo por produto uma ficção trabalhada em ambiguidades, o que resulta em histórias representativas do mundo ao seu redor, levando-o a retratar elementos fantásticos do cotidiano, em prol de narrativas do absurdo (VAZ, 2000, p. 34). Tal decorre, em suas palavras, porque “o homem do interior poderia estar na Groelândia, pois não se fizeram homens diferentes para habitar a Terra. Os problemas existenciais são os mesmos” (1982, apud SOUZA, 1990, p. 51). Nos textos de Veiga, a irrupção do insólito se dá como no conto “A máquina extraviada” (VEIGA, 1997, p. 90), no qual uma máquina, cuja função todos desconheciam, interfere nos hábitos e costumes da população de uma cidade interiorana; ou como em A hora dos ruminantes (1966), em que os manarairemenses veem a cidade dominada primeiro pelos homens da tapera e, em seguida, por cães e bois.

Se, na sua prosa, a banalização dos acontecimentos é lugar-comum – morte, invasões, etc. – o mesmo ocorre com o elemento insólito, que se manifesta de maneira banalizada. Nela, a irrupção do acontecimento incomum apontaria para “a existência de um modo discursivo ou gênero ou subgênero literário em que a manifestação do inesperado, logo, do insólito, fosse representada de maneira absurda” (CANDIDO, 1987, p. 210-211). Em “Era só brincadeira”, da coletânea Os Cavalinhos de Platiplanto (1974), sob a égide de um julgamento absurdo, apresentam-se elementos da influência de Kafka. em “A usina atrás do morro”, de A estranha máquina extraviada (1977), a banalização da violência, com personagens sendo desumanizadas – espécie de metamorfose –, perdendo todos os aspectos de civilidade e matando seus conterrâneos, no processo.

“Os Cavalinhos de Platiplanto” (VEIGA, 1974, p. 27) é uma narrativa fundamental para entender como Veiga mescla um sobrenatural familiar às relações cotidianas, e como o faz por meio de espaços fantásticos – Platiplanto, mas também Vasabarros, Taitara e Manarairema. Esse insólito é construído pelo recurso a uma linguagem simples e interiorana, permitindo, por vezes, a representação de um regionalismo cru.

REFERÊNCIAS

CANDIDO, Antonio. A nova narrativa. In: CANDIDO, Antonio. A educação pela noite e outro ensaios. São Paulo: Ática, 1987.
VAZ, Geraldo Coelho. Literatura Goiana: síntese histórica. Goiânia: Kelps, 2000.
VEIGA, José J. Uma leitura da obra de José J. Veiga. Campinas: Editora da UNICAMP, 1990
VEIGA, José J. A hora dos ruminantes. Rio de Janeiro: Civilização brasileira, 1966.
VEIGA, José J. Os cavalinhos de platiplanto. Rio de Janeiro: civilização brasileira, 1974.
VEIGA, José J. A estranha máquina extraviada. Rio de Janeiro: Bertrand, 1997.

BIBLIOGRAFIA COMPLEMENTAR

CARNEIRO, Fabianna Simão Bellizzi; SILVA, Alexander Meireles da. O Espaço do Fantástico nos contos: “Os Cavalinhos de Platiplanto” e “Fronteira”, de José J. Veiga. In: CAMARGO, Flavio Pereira; CARDOSO, João Batista. Percursos da narrativa brasileira contemporânea: coletânea de ensaios- volume II. Goiânia: Ed. Da Puc Goiás, p. 37-48, 2011
QUELHAS, Iza Terezinha Gonçalves. Hera, muros e ruínas: a alegoria na obra de José J. Veiga. 316f. Dissertação (Mestrado em Teoria Literária) – Faculdade de Letras da UFRJ, Rio de Janeiro, 1990.
TRINDADE JR, João Olinto. Discursos contra-hegemônicos na obra de José J. Veiga e Mia Couto. 160f. Tese (Doutorado em Teoria da Literatura e Literatura Comparada). UERJ, 2019. Disponível em: http://www.bdtd.uerj.br/tde_busca/processaPesquisa.php?pesqExecutada=1&id=11510&PHPSESSID=d58urqjkbbmn9861onsupc1n86. Acesso em 22 ago. 2019.