FANTASIA IMERSIVA

Diana Marques

Fantasia Imersiva é um conceito criado por Farah Mendlesohn que designa um dos vários tipos de construção de mundos fantásticos. Mendlesohn, em Rhetorics of Fantasy (2008), abandonando uma tentativa de definição de Fantasia, vai interessar-se pela construção desse género através da sua linguagem e retórica. Desse modo, a autora usa um sistema que explora a forma como os autores constroem os seus mundos, propondo quatro modos distintos de Fantasia, definidos a partir da maneira como a protagonista se relaciona com o mundo ficcional que a rodeia. São eles: “fantasia de portal-demanda” (portal-quest), “fantasia intrusiva” (intrusion), “fantasia liminal” (liminal) e “fantasia imersiva” (immersive).

De acordo com a autora, a Fantasia Imersiva é uma narrativa fantástica ambientada num Mundo Secundário completamente imaginado sem qualquer referência explícita e direta ao mundo do leitor (Mundo Primário), sendo, por isso, impermeável a influências externas a ele. Dessa forma, é construída uma ironia da mimese que parte do pressuposto que o leitor, embora não faça parte do mundo construído, partilha das mesmas suposições que as personagens (MENDLESOHN, 2008, p. 59). Nesse sentido, a relevância maior é colocada no narrador omnisciente, uma vez que é através do seu olhar que o leitor consegue se colocar na mente das protagonistas, aceitando a sua visão do mundo e interpretando-o de acordo com aquilo que sabem, ou não.

A Fantasia Imersiva preocupa-se, maioritariamente, com a entropia do mundo apresentado, focando-se na dissolução, desordem e destruição do mundo fantástico, porque aquilo que é narrável não é a descoberta do mundo, mas sim a sua perda (MENDLESOHN, 2008, p. 61). Assim, é recorrente em obras de Fantasia Imersiva o leitor assistir à queda de cidades, países ou civilizações, à degradação de sistemas políticos e consequente declínio moral, ou mesmo a mundos que, até então impenetráveis, veem as suas muralhas derrubadas por fatores externos.

Nessas narrativas, é comum o mundo conhecido estar sob a ameaça de destruição por parte de um agente que o pretende reduzir a algo insignificante, caracterizado essencialmente pela perda: a perda da magia, dos deuses ou do divino, a transformação de uma terra fértil num deserto, ou sobre as consequências de um reinado de um “Dark Lord” (CLUTE e GRANT, 1997, p. 339).

A Fantasia Imersiva olha, ainda, para o mundo construído de forma enviesada, fazendo uso de uma banalização do fantástico. Segundo esse pressuposto, o narrador assume que o leitor tem um entendimento completo do mundo que lhe é apresentado, de tal forma que a sua atenção é dirigida para elementos considerados banais e não para os que lhe causam estranheza e estupefação. Dessa forma, os mundos da Fantasia Imersiva são construídos através de vislumbres de paisagens concretas, cabendo ao leitor preencher as lacunas com a sua imaginação, e em que aquilo que não é dito é tão importante como aquilo que é dito (MENDLESOHN, 2008, p. 73). Assim, quanto mais árduo for o trabalho da imaginação do leitor, maior será a sua imersão no mundo fantástico, sendo essas as características que permitem a um autor escrever uma obra reconhecida como Fantasia, mas que contém pouca ou nenhuma magia (MENDLESOHN, 2008, p. 66-67).

De fulcral importância é, ainda, o papel das protagonistas que irão mediar a visão do leitor sobre o mundo que lhe está a ser descrito. Nesse sentido, as protagonistas são quase sempre antagonistas no seu próprio mundo, no sentido em que, de alguma forma, questionam o que as rodeia e opõem-se à ordem pré-estabelecida. Por serem antagonistas, analisam aquilo que veem independentemente da perceção do leitor e daquilo que ele sabe, relatando a sua verdade individual.

Assim, a Fantasia Imersiva preocupa-se, maioritariamente, com a direção do olhar do leitor e é através da linguagem e da retórica usadas para construir esse mundo, mediado pelo olhar das protagonistas, que a imersão do leitor se torna possível. Alguns dos exemplos mais paradigmáticos de obras de Fantasia Imersiva são The Lord of the Rings (1954-1955), de J. R. R. Tolkien, o Ciclo Earthsea (1986-2001), de Ursula K. Le Guin, The Wheel of Time (1990-2013), de Robert Jordan, e A Song of Ice and Fire (1996-2011), de George R. R. Martin.


REFERÊNCIAS

CLUTE, John; GRANT, John. Fantasy. The Encyclopedia of Fantasy. St Martin’s Griffin. p. 337-340, 1997.
MENDLESHON, Farah. Rhetorics of Fantasy. Wesleyan, 2008.