ALUÍSIO AZEVEDO – ficcionista

Marina Sena

Aluísio Tancredo Gonçalves de Azevedo nasceu em 14 de abril de 1857, em São Luiz do Maranhão. Foi um dos grandes discípulos de Émile Zola (184-1902) entre nós. O autor é consensualmente reconhecido como mestre do Naturalismo no Brasil e tal fato não se deve apenas ao teor de suas obras. Deve-se, também, à defesa que Aluísio fazia em alguns de seus romances de que um escritor deveria fazer ficção tal como se fazia ciência: com a frieza e a objetividade defendidas pelo movimento naturalista.

Até a sua morte, em 21 de janeiro de 1913, e ao longo de dezoito anos de carreira, Aluísio escreveria cerca de trinta narrativas, as quais a historiografia literária costuma dividir em duas categorias: as literárias e as subliterárias. O primeiro romance de Aluísio Azevedo, Uma lágrima de mulher (1879) é o caso de uma narrativa julgada por muitos apenas como uma “narrativa fantasiosa”, nas palavras de Orna Levin. O romance é pouco apreciado pela crítica, sendo comum que se atribua sua estreia propriamente literária a O Mulato, de 1881.

O livro de mais notoriedade de Aluísio Azevedo, O Cortiço (1890), tem, naturalmente, um cunho fortemente realista e naturalista, no que concerne ao enredo, às descrições e à construção de personagens. Na totalidade de sua obra, os traços ligados ao Gótico, ao Insólito e ao Fantástico são mais evidentes naquelas narrativas postas em segundo plano pela crítica – as subliterárias. Um valor maior é atribuído às narrativas de cunho expressivamente naturalista, como O Cortiço, e um menor àquelas que podem ser incluídas no rol da ficção fantástica, como A mortalha de Alzira (1890).

A importância de Aluísio Azevedo para os estudos do Insólito justifica-se quando verificamos, em Mortalha, os ambientes atros, a predominância de ações ocorridas à noite, a trama misteriosa, a presença de personagens imaginativas e desconfiadas do discurso científico e o acentuado teor, ao mesmo tempo, mórbido e sexual. Também há, como características facilmente identificáveis, o tema do duplo, do vampirismo psíquico e a preferência por espaços narrativos sombrios, como castelos e cemitérios.

Tais características não são exclusivas de A Mortalha de Alzira, ocorrendo também em contos como “O Impenitente” (1898) e “Demônios” (1891). Não por acaso, pouco tributárias das convenções naturalistas, essas narrativas são escassamente estudadas pela crítica. A percepção de que há um “desvio” do Naturalismo em direção a outras poéticas, como o Fantástico e o Gótico, é um fator importante para que a crítica e a historiografia literárias atribuam um valor inferior a tais obras.

As características ditas folhetinescas e românticas das obras de Aluísio – que fomentaram a cunhagem de predicados como “tendência idealista do espírito” e “lances sentimentais”, nas palavras de Pereira (1988), entre outras expressões – podem ser melhor compreendidas e analisadas se pensadas pelos estudos do Insólito ficcional. A denominação genérica de narrativas “subliterárias” parece apenas apontar para a incapacidade da crítica brasileira novecentista em identificar a presença do Fantástico em nossa literatura.

REFERÊNCIAS

LEVIN, Orna Messer (Org). Aluísio Azevedo romancista. In: AZEVEDO, Aluísio. Aluisio Azevedo: ficção completa em dois volumes. Rio de Janeiro: Nova Aguilar, 1, p. 15-42, 2005.
PEREIRA, Lúcia Miguel. História da literatura brasileira; prosa de ficção; de 1870 a 1920. São Paulo: Editora da Universidade de São Paulo, 1988.

BIBLIOGRAFIA COMPLEMENTAR

AZEVEDO, Aluísio. Aluisio Azevedo; ficção completa em dois volumes. LEVIN, Orna Messer (Org). Rio de Janeiro: Nova Aguilar, 2005.
BATALHA, Maria Cristina. Le paysage dans ‘Demônios’ de Aluisio Azevedo: une troisième rive du naturalisme. In: PENJON, Jacqueline (Org). Cahier du Crepal, Paysages de la lusophonie – intimisme et idéologie. Paris: Presses de la Sorbonne-Nouvelle, v. 15, n. 15, p. 115-126, 2009.
FANINI, Angela Maria Rubel. Os romances-folhetins de Aluísio Azevedo; aventuras periféricas. 2003. Tese (Doutorado em Teoria Literária) 350f. Universidade Federal de Santa Catarina, Florianópolis.
MENON, Mauricio Cesar. Figurações do gótico e de seus desdobramentos na literatura brasileira de 1843 a 1932, 2007. Tese (Doutorado em Letras) 275f – Programa de Pós-Graduação em Letras, Universidade Estadual de Londrina, Paraná.
MÉRIAN, Jean-Yves. Aluísio Azevedo; vida e obra (1857-1913). Rio de Janeiro: Fundação Biblioteca Nacional, Garamond, 2013.
PRADO, Antonio Arnoni. Aluísio Azevedo e a crítica. In: AZEVEDO, Aluísio. Aluísio Azevedo: ficção completa em dois volumes. Rio de Janeiro: Nova Aguilar. p. 43-54, 2005.
SENA, Marina. O Gótico-Naturalismo na literatura brasileira oitocentista. 2017. Dissertação (Mestrado em Teoria da Literatura e Literatura Comparada). Universidade do Estado do Rio de Janeiro, Rio de Janeiro.
SENA, Marina; FRANÇA, Júlio. Do Naturalismo ao Gótico: as três versões de ‘Demônios’, de Aluísio Azevedo. Revista SOLETRAS, Rio de Janeiro, 27, p. 95-111, 2014.